quarta-feira, 8 de abril de 2009

Handel - gigante cosmopolita no séc. XVIII


O compositor mais importante da Inglaterra no século XVIII não era inglês. Após a morte de Purcell, a música inglesa ficou estagnada e só voltou a ter vida décadas depois, com as grandiosas obras de um compositor alemão, nascido na cidade de Halle em 1685. Georg Friedrich Haendel era filho de Georg Haendel, um conhecido cirurgião-barbeiro de Halle e também da corte de Saxe Weissenfels. Friedrich mostrava talento para a música ainda muito novo, mas seu pai não o encorajou e o matriculou no colégio com o intuito de que seu filho seguisse a carreira jurídica. Assim, o pequeno Handel estudava cravo às escondidas do pai enquanto continuava seus estudos formais. Mas não esconderia seu talento por muito tempo. Acompanhando seu pai em uma visita à corte de Weissenfels, com apenas sete anos, Handel resolveu brincar no órgão da capela na presença do duque de Saxe e de seu mestre de capela, Johann Krieger. Os dois ficaram impressionados com a técnica prodigiosa do menino e aconselharam Georg pai a oferecer educação musical ao seu filho. Ao voltarem à Halle, Georg colocou o pequeno Handel em aulas de cravo, com a condição de que ele continuasse seus estudos regulares. E assim começou oficialmente a história musical de Handel.

Se primeiro professor foi F.W. Zachow, principal organista de Halle, que começou lecionando cravo ao menino, mas logo depois, notando sua grande aptidão para a música, passou a ensinar também órgão, violino, oboé, harmonia, contraponto e instrumentação. Aos doze anos, Handel escreveu suas primeiras sonatas para cravo e oboé. Um ano depois, seu pai faleceu e, em memória dele, Handel prometeu seguir com os estudos jurídicos, chegando a ingressar na Faculdade de Direito em 1702. Handel estava cada vez mais envolvido com a música e aos dezoito anos já era considerado um virtuoso do cravo, do órgão e do oboé. Mas a ambição por se tornar ainda maior o fez abandonar a faculdade em 1703 e ir da pequena Halle para Hamburgo, a capital alemã da cultura naquela época. Lá começou a trabalhar como cravista e violinista na orquestra de ópera. Aprendeu sobre o método composicional do gênero e escreveu sua primeira ópera, Almira, que lhe rendeu grande fama e muitos alunos pagantes. Vendo o declínio do teatro de ópera alemão, e com bastante dinheiro no bolso, Handel deixou a Alemanha três anos após chegar à Hamburgo e se mudou para Florença, na Itália. Lá escreveu e apresentou a ópera Rodrigo, que também foi muito bem recebida pelo público. Viajou para Veneza, onde conheceu Lotti e Scarlatti, depois para Roma e para Nápoles, voltando para Veneza em 1709, onde escreveu a ópera Agrippina, novamente obtendo grande successo.

A vida ia bem para Handel na Itália, mas ainda em 1709 ele recebeu um convite do príncipe-eleitor de Hanover, George Ludwig, para ser o mestre de capela em sua corte. Handel voltou para a Alemanha e após pouco mais de um ano tirou uma licença para ir à Inglaterra, já que os dois países tinham ligações de poder na época, apresentar uma ópera. Chegou à Londres em dezembro de 1710 e no ano seguinte escreveu, em apenas duas semanas, a ópera Rinaldi, com imediata aclamação dos ingleses. Handel ficou encantado com a vida musical em Londres e passou muito tempo em viagens entre Hanover e a capital inglesa até 1713, quando abandonou a corte de Ludwig e fixou residência na corte da rainha Ana, adotando seu nome anglicano, George Frederick Handel. No ano seguinte a rainha faleceu e o príncipe-eleitor de Hanover foi coroado rei, com o nome de Gorge I. Handel passou a compor para a capela real, atingindo sua maturidade musical e escrevendo músicas instrumentais e sacras, entre elas seus Te Deums e o oratório Esther.

Um grupo de apreciadores de arte endinheirados aproveitou a prosperidade econômica da Inglaterra e fundou, em 1720, a Academia Real de Música, com o propósito de apresentar óperas, contratando Handel como seu primeiro diretor. Lá voltou a ter trabalho intenso com música teatral e compôs muitas óperas de grande sucesso. Por causa de intrigas e brigas internas, a companhia de ópera se dissolveu, mesmo após o êxito da Ópera dos Mendigos, uma sátira à ópera italiana. Handel então se dedicou novamente à música instrumental e aos hinos de coroação de George II. A fama de Handel foi desaparecendo após o fracasso da companhia de ópera e ele acabou indo para a Irlanda, onde fez a primeira apresentação de sua obra-prima, o Messias. Só em 1746, quando os ingleses ganharam a batalha contra os rebeldes escoceses comandados por Charles Edward, que Handel compôs as peças Judas Maccabaeus e A Song of Victory Over Rebels, e o compositor de Halle, agora oficialmente nacionalizado inglês, voltou a ser aclamado na Grã-Bretanha.

Nos anos seguintes Handel tornou a se dedicar à música sacra, escrevendo corais e oratórios. Foi quando escrevia seu último oratório, Jephta, que começou a apresentar sinais de cegueira. Conseguiu terminar Jephta em 1751 e encerrou sua carreira como compositor, tocando ainda em concertos para órgão ou dirigindo as execuções de suas peças. Em 1753, Handel ficou completamente cego, e passou a se apresentar muito esporadicamente. Seu último concerto foi uma apresentação do Messias, no Convent Garden, em abril de 1759. Uma semana depois ele faleceu, sendo enterrado na abadia de Westminster, a mesma de Purcell.

Todo mundo conhece, já ouviu ou já cantarolou alguma parte do Messias, principalmente o Aleluia, o trecho mais conhecido. O trecho coral do qual mais gosto é For Unto us a Child is Born, aqui apresentado pelo Winchester Cathedral Choir, com um vídeo da partitura coral. Genial. Aproveitem:

For Unto us a Child is Born

Gigantes barrocos

Assim como fazem com Purcell e Mozart, muitos críticos gostam de comparar Handel a Bach. Aqui uma comparação menos injusta, já que os dois foram contemporâneos, nascidos no mesmo ano. Os dois foram gigantes, suas músicas eram de extrema complexidade, ambos usaram a fé luterana para criar divinas obras sacras, ambos criaram um novo estilo de complexidade polifônica, utilizaram a música vocal com amplitude e foram virtuoses no órgão. Mas tiveram vidas diferentes que levaram a resultados musicais diferentes. Bach pertencia a uma cultura provinciana, enquanto Handel circulava pela alta sociedade londrina. Bach se ateve às peças sacras e à música instrumental e Handel pôde experimentar estilos e gêneros mais variados. Handel é mais grandioso. Bach, mais detalhista e complexo. Comparações assim são sempre injustas. O curioso é que Handel poderia ter conhecido J.S. Bach – quando soube que sua mãe, além da cegueira, havia começado a apresentar paralisia, Handel voltou à Alemanha e foi convidado por um dos filhos do mestre Bach a passar uns dias na casa de seu pai em Leipzig. Mas como ele precisava voltar à Londres, recusou o convite. Quem sabe o que poderia ter saído de uma troca de conhecimentos destes gigantes do período barroco...

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